domingo, 28 de setembro de 2008

Eu acho muito engraçado

Acho engraçado a imprensa quase toda dar importância pra a tal CPI dos grampos. Uma CPI inventada pra dizer que a polícia que prendeu o ladrão é que deve à sociedade.
O ladrão, que a justiça soltou, roubou, mas não pode ser preso só por isso. Se a polícia usou escutas telefônicas para provar o roubo, ah, aí o roubo não valeu.
Acho muito engraçado.
Acho engraçado também a revista Veja fazer até matéria de capa pra falar de educação e o resto da imprensa achar que tá tudo bem. Gente, a Editora Abril tá lançando uma linha de livros, apostilas, manuais, sei lá como é que aquilo chama, didáticos. Há algum tempo já vem batendo nas futuras concorrentes, editoras e esses sistemas de ensino que vendem como franquias seu material, tipo COC, Pitágoras, Objetivo, etc. Tudo bem que nossa educação é uma porcaria e que esses materiais em geral também, mas a Veja, meu Deus, a Veja dar palpite sobre o excesso de ideologia nas salas de aula, é demais! Um conglomerado jornalístico que há quase 30 anos só pratica ideologia, jornalismo zero. E quase ninguém fala nada.
Acho muito engraçado.
Também acho engraçado o acesso de patriotismo repentino que a topada que o governo equatoriano deu na Odebrecht gerou. A megaconstrutora, que aqui no Brasil tá envolvida em todos os casos de corrupção ativa e passiva, superfaturamento, lobismo, tráfico de influência e obras que caem, sem nunca ser perturbada, foi fazer o mesmo no Equador. Nós aqui no Brasil, ao invés de ficarmos envergonhados por exportar a sujeira brasileira, ficamos indignados como se fôssemos todos acionistas da corrupção: Como é que aqueles índios de mer fazem isso! Quem eles pensam que são? Estão desrespeitando nosso país (a Odebrecht?).
Acho muito engraçado.
E acho mais engraçado ainda a reação da imprensa nacional diante da questão econômica internacional ou, mais especificamente, norteamericana. Não entendo nada de economia, mas sei que o liberalismo absoluto levado a cabo lá, principalmente pelos governos republicanos, e aqui, principalmente pelo governo FHC, quebrou. Aqui já tinha quebrado três vezes durante aquele triste período e quebrou também no México e na Argentina. Pois é, agora quebrou na metrópole. O estado teve que salvar, e vai ter que continuar salvando. Pensa que os caras aqui fizeram mea culpa e se arrependeram de ter defendido o mesmo, pediram desculpas, mudaram? Que nada. Ficam esperando a hora da coisa se espalhar. Ficam dizendo que o Brasil não está protegido. Que é vulnerável também, etc. Pode até ser. Mas, peraí, e se nós não tivéssemos votado por uma tendência um pouco diferente? E se continuássemos no mesmo sentido e seguindo os passos do neo-liberalismo de lá?
Não é muita cara de pau?
Eu acho muito engraçado. Mas não consigo rir.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Sobre o que chamam de paternalismo

O ministro Patrus Ananias cunhou a melhor frase sobre o assunto que eu já ouvi:
Esses mitos se devem a setores cada vez mais minoritários, encastelados em instituições de poder, que mantém uma ideologia decorrente da escravidão, do coronelismo, das capitanias hereditárias e do mandonismo, ainda que revestidas de uma falsa modernidade.
O Patrus tava falando daquelas pessoas que vivem repetindo por aí que bolsa-família é paternalismo, que não faz bem ao povo (como se estivessem preocupados com o povo), que a contemporaneidade reside em deixar o mercado, portanto o capital, resolver tudo, etc.
O que eu acho é que essa posição é cruel e egoísta.
Ou alguém aí em sã consciência consegue achar que uma pessoa pode ou deve sofrer por necessidades fisiológicas (fome, frio, doença, etc.) não atendidas simplesmente porque não coube nos planos da sociedade para si mesma?
Alguém acha mesmo que se não houve forma de que essa pessoa (criança, adulto ou velho) fosse – ou tivesse – seu próprio provedor, seja por qualquer razão, ela deve ser condenada e executada?
Não é isso que a sociedade faz quando não é “paternalista”?!
Não é isso o que defende, embora de forma pouco explícita, quem diz que programas sociais patrocinados pelo governo são esmola. Aquela conversa de dar o peixe ou ensinar a pescar...
Curiosamente essas mesmas pessoas costumam bater no peito e gritar que participam de ações de filantropia, caridade ou sei lá como é que chama hoje esse marketing travestido de preocupação social. Aí não é esmola. É o quê?
Toda forma de governo, seja ele representante de qualquer ideologia, tem que eleger, constantemente, prioridades para agir. Tá bom, isso é óbvio. Construir uma escola e garantir educação para as crianças ou uma fábrica e garantir emprego para os pais? Apoiar o setor exportador e trazer divisas de fora ou segurar a produção no mercado interno e garantir seu abastecimento a preços menores?
Beleza, tem cem milhões de coisas para ficar decidindo entre duas ou sei lá quantas possibilidades.
Mas há uma opção que já passou da hora de parar de fazer: fingir que estamos investindo na subsistência futura de gente que precisa subsistir hoje. Sinceramente, meus amigos, não dá pra a gente ficar brincando de Deus Jardineiro e dizer: deixa esse povinho que nasceu com defeito morrer pra ver se nasce outro melhor no lugar...

Lei seca eu???

O grande exercício do momento é perguntar-se, pensar e responder sinceramente, pensando também, em voz baixa, só pra você, sem ninguém saber sua resposta:

Sou capaz de abrir mão de alguma coisa muito importante para mim, só para mim, em benefício de outras pessoas? Outras pessoas... um grupo determinado (ou não) de pessoas. Gente que eu não conheço, não gosto, nunca vi. Anônimos pra mim. Alguns desses...
Qual seria o benefício para essas pessoas? Sei lá... alguma coisa boa, um pouco mais de qualquer coisinha boa não muito importante.

Qual a sua resposta?

Vamos mudar a pergunta:
Sou capaz de abrir mão de alguma coisa relativamente importante para mim, só para mim, em benefício de muitas pessoas? Outras pessoas... um grupo grande, determinado (ou não) de pessoas. Gente que eu não conheço, não gosto, nunca vi. Anônimos pra mim. Vários desses...
Qual seria o benefício para essas pessoas? Sei lá... alguma coisa muito boa, um pouco mais de alguma coisa boa e importante.

Resposta?

Mudando outra vez:
Sou capaz de abrir mão de alguma coisa não muito importante para mim, só para mim, em benefício de uma multidão de pessoas? Outras pessoas... um grupo enorme determinado (ou não) de pessoas. Gente que eu não conheço, não gosto, nunca vi. Anônimos pra mim. Centenas desses...
Qual seria o benefício para essas pessoas? Sei lá... alguma coisa essencial, um pouco mais de dignidade, por exemplo, uma existência melhor para todas elas.

Resposta:

De novo:
Sou capaz de abrir mão de alguma coisa pouco importante para mim, só para mim, em benefício de todas as outras pessoas? As outras pessoas... um grupo gigante determinado (todas as pessoas ao meu redor onde eu estiver). Gente que eu conheço ou não, gosto ou não, a maioria nunca vi, mas existe. Anônimos pra mim, a maioria. Milhares desses...
Qual seria o benefício para essas pessoas? Sei lá... alguma coisa fundamental pra todo mundo: a vida, por exemplo.

Então...
Até onde você é capaz de ir para manter seu direito de tomar uma cervejinha e ir embora pra casa dirigindo seu carro?